Monday, July 26, 2010

"Um dia a dia" para o meu avô



Meu avô era um cara bem legal, porém, ele não falava muito. Sempre quando eu ia na casa dele, ele passava a mão na minha cabeça e dava um sorriso daqueles sem mostrar os dentes. Eu morava bem perto da casa dele então ia sempre lá.

Um dia, quando eu estava na casa do meu avô, de repente começou uma gritaria. Fui dar uma espiada. Ele estava quieto em pé em um canto da sala enquanto minha vó estava sentada em um sofá, chorando com as mãos no rosto. Minha tia colocava os braços em volta dela, falando alguma coisa. Minha mãe estava próxima à porta gritando com meu avô. Ela queria saber o porquê daquela decisão repentina e que aquilo não se fazia com ninguém. Meu avô só ficava olhando enquanto minha tia e minha mãe gritavam com ele.

Alguns dias depois eu soube a razão da confusão. Meu avô tinha resolvido sair de casa e se separar da minha avó. Ele alugou um apartamento no centro da cidade. A verdade é que o dia da discussão seria o último dia que veríamos o meu avô. Ele não atendia nenhum telefonema da família e nem ninguém da família que fosse no apartamento dele. Uma semana depois de ter saído de casa, o senhorio encontrou ele morto no sofá e de cueca. Dizem que era um vizinho alegre e que, na única semana em que ele ficou no prédio, meu avô conheceu metade dos moradores.

Depois de muitos anos, minha mãe contou que ele tinha ido ao médico para fazer uma revisão. O médico disse que ele tinha uma semana de vida. Assim, meu avô sabia que ia morrer quando saiu de casa. Ninguém nunca entendeu porque ele saiu de casa quando poderia morrer junto da família. A minha hipótese é que ele não era tão livre assim. Acho que ele foi viver realmente "um dia a dia" só dele, no qual ele poderia fazer o que quisesse, por exemplo, andar de cueca em casa.

Revisão por Felipe Nogueira e Bruno França


p.s: Esta estória é ficção =)

Monday, July 19, 2010

A Estória

Eu conheci um cara que queria muito ser escritor. Sempre que ele tinha alguma ideia, logo a escrevia. Mas ele sempre sentia que não escrevia "A Estória". Aquela história que tocaria e mudaria algo nas pessoas. Um dia ele finalmente escreveu "A Estória". Ele lia e relia várias vezes. Quando se cansava de ler voltava para suas atividades, mas depois logo voltava a ler "A Estória". Assim que ele sentiu que aquela era "A Estória", resolveu publicá-la. No entanto, como não existem livros de uma página só, decidiu escreve-la em um powerpoint e passar por email. Dessa forma, ele passou para um amigo, que passou para outro e assim "A Estória" ficou conhecida por muitas pessoas. O problema é que depois de escrever "A Estória", o cara perdeu a inspiração. No fundo, ele deve ter se sentido realizado em alcançar seu objetivo de tocar ou mudar as pessoas. Acho que depois disso ele passou em algum concurso público cujo cargo não exige que se escreva muita coisa.


Revisão por Bruno França

Monday, July 12, 2010

Ônibus

Eles não se viam há anos. Ela tinha se mudado de
bairro e ele perdeu o telefone dela. Foram se
reencontrar anos depois dentro de um ônibus lotado.
Quando se deram conta, estavam espremidos um
contra o outro. A conversa foi cheia de lacunas de
silêncio. Parecia que um estava envergonhado de ver
o outro. Mas a verdade é que depois de tantos anos
não sabiam exatamente o que dizer. Ambos tinham
planejado, anos antes, o que diriam um ao outro se se
encontrassem. Porém, como nem tudo ocorre como
se planeja, nada foi dito e ela desceu no ponto dela.
Nunca mais se encontraram depois disso.


Publicado no caderno literário de junho da editora Pragmatha